Publicado na Coluna Oficina de Cinema na edição 5 do Zine Gueto Metragem
Por Daniel Neves
A
montagem no cinema
Quando estamos no Set
de produção, é hora de executar tudo que foi planejado no extenso período de
pré – produção. Em geral, para dar mais agilidade logística, gravamos nossos filmes
em dois ou três dias. Toda equipe adentra um processo de troca, de diálogo, ao
mesmo tempo que cada um cuida mais especificamente de uma parte. Luz, câmera,
ação, cria-se um mundo imaginário, não é mentiroso nem real, mas é verdadeiro.
Terminadas as
gravações, parece resolvido. Porém, só cumprimos metade do processo. Vai o
diretor – montador se responsabilizar por cuidar de todo material captado,
adicionando ainda trilha sonora, sonorização, coloração e por aí vai. Ou seja,
o momento da montagem é onde o filme se completa. Dado esse nível de
compromisso, tal etapa do trabalho pode durar mais tempo do que tudo que fora
feito anteriormente. No cinema independente, o filme parece que nunca vai ficar
pronto, sempre falta algo, até na estreia ainda enxergamos o que se possa
melhorar. Para mim, um filme fica pronto quando não consigo mais mexer nele,
embora eu ainda queira.
A montagem é tão
importante que definiu a própria linguagem do cinema, como disse o mestre
Einsenstein, cineasta soviético da primeira metade do século 20 que investigou
cuidadosamente os cortes. Num filme, usamos diversas outras artes, mas elas só
fazem sentido, só viram cinema, quando
são editadas. Basicamente, montar é cortar e colar, você vai juntando pedaços
de vídeos, todavia, não é uma junção aleatória, parte muito do que se sente, de
que emoção se quer passar. Não é, necessariamente, um caminho linear, mas está,
como todo o resto, ligado ao roteiro e à linguagem da direção.
Como já retratamos em
outras edições do zine, até cerca de 20 anos atrás, o único material usado para
se fazer um filme era a película. Após a filmagem, o cineasta reunia os
negativos, que eram bem complicados de serem armazenados. Na sala de montagem,
existia a “Moviola”, equipamento em que se rodavam os rolos de filmes. Fazia-
se o corte na tesoura e se usava uma cola para fixar os pedaços.
Não há dúvida que a
recente adesão ao digital facilitou imensamente esse processo. Agora,
armazenamos as imagens em cartões de memória, na média baratos, onde cabem
horas e horas de arquivo. Depois guardamos tudo em HDs externos ou nuvens na
internet. É bom organizar isso em pastas com nomes de cenas ou temas. Antes de
iniciar a montagem, assistimos tudo diversas vezes, fazemos anotações,
debatemos.
Em vez da moviola,
temos, praticamente em qualquer computador, o acesso aos programas de edição. A
licença de um costuma ser cara, mas é possível comprar craqueado. Adquirindo um
CD pirata de 10 reais conseguimos programas como Premier, Sony Vegas etc.
Com o material
importado para o programa, vem à etapa essencial da montagem: o corte. Como
escolher a melhor imagem? Numa cena de ficção, por exemplo, um personagem se
vira para o outro e vai dizer que o ama. A fotografia me deu um plano aberto
mostrando os dois e um plano no rosto do personagem que fala, além de um
detalhe da boca dele. Começo em qual dos planos? Termino em qual? E se for um
documentário em que uma determinada pessoa fala para a câmera sobre o grande
amor da sua vida e eu tenho dela planos se arrumando no espelho, andando no
quintal, fazendo café, olhando uma foto, como monto isso, como reúno esses
retratos e trago significado para eles?
Uma dica essencial dada
por muitos montadores é a intuição, como afirma o consagrado montador Walter
Murch no seu clássico livro “Num Piscar de olhos, Zahar, 2004”. O autor editou
filmes como o épico “Apocalipse Now, de Copolla, 1979”, e defende a ideia de
“sentir o corte”, como numa piscada de olhos. Deixe a maré te levar.
É comum que no começo
seja uma coisa bem nebulosa, o segredo é ir tocando até que em dado instante se
consiga visualizar o todo. A montagem satura, é preciso parar de vez quando,
deixar de editar, relaxar, até mostrar o filme pra amigos, ver outros filmes.
Como lugar tão decisivo, buscamos na Companhia bueiro Aberto fazer montagens
coletivas, com duas ou três cabeças dialogando.
Sabemos que,
independente de documentário ou ficção, o cinema conta uma história, tem um
discurso, reúne uma cadeia de acontecimentos e dá sentido a eles. Desse modo
está nas mãos do montador a determinação do ritmo. Obviamente, como estamos nos
referindo ao audiovisual, ou seja, mistura de áudio com visual, é sempre bom já
ter o som dos diálogos e ruídos das cenas, além da trilha sonora que vai dizer
qual rumo tomar.
Depois do filme
montado, vamos para a finalização, que é justamente a edição de som e a edição
de imagem, esta última cuida da colorização. Mas sobre esses dois aspectos da
pós – produção, pretendemos dar um espaço futuro específico nessa coluna.
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