sábado, 26 de junho de 2021

Fim de semana histórico para o vídeo popular

     A partir dos anos 2000, iniciou-se um processo de ampliação das produções audiovisuais nas periferias. Parece que o povo, aquele tão aclamado com sua imagem na tela pelo Cinema Novo e por Central do Brasil e Cidade de Deus, não estava apenas como personagem de uma estória, mas a criando atrás das câmeras.  Entre mostras, cursos, pesquisas acadêmicas, articulações começam a surgir denominações conflituosos: cinema de periferia, cinema de quebrada, cinema de favela, cinema de comunidade.

            Muitas vezes o incômodo dessas denominações vinha pelo fato dela virem de uma catalogação externa, não nascida dos coletivos que se formaram, embora houvesse entre os grupos a discussão e criação destes termos. Na segunda metade dos anos 2000, diversos coletivos da periferia de São Paulo se juntam e formam o Coletivo de Vídeo Popular. Eles se denominam assim porque o vídeo é um suporte diferente da película cinematográfica, mas também porque vídeo popular busca não banalizar uma produção que se fazia bem diferente daquele dito “cinema”, com todas as precariedades e desigualdades do mercado audiovisual e com uma mensagem e abordagem questionadora. Além disso, vídeo remete a Associação brasileira de Vídeo Popular (ABVP), que nos anos 80 articulou e produziu obras em torno dos movimentos sociais, principalmente o movimento sindical.

            O Coletivo de Vídeo Popular criou o Circuito de Exibição nas quebradas e em diversos espaços da cidade, a Revista de Vídeo Popular, organizou discussões, cobrou políticas públicas, questionou uma representatividade superficial da periferia e a própria ideia de periferia. Isso se deu a partir de 2008 e com o passar dos anos, ao mesmo tempo que ganhou força, o Coletivo diminuiu o ritmo. Mas nos últimos tempos começa a se desenvolver uma rearticulação, a princípio, com o diálogo maior entre os coletivos, mas com a perspectiva de se firmar um grupo orgânico.

            Esse final de semana é um marco nessas discussões. No dia de hoje, nós, do Zine Gueto metragem e da Companhia Bueiro Aberto, trazemos uma edição especial com a trajetória e perspectiva do Coletivo de Vídeo popular, contando com colunistas que participaram desse corre, como Daniel Fagundes, Fernanda Vargas, Guillhermo Aderaldo e entrevista com Flávio Fabcine. O lançamento ocorre no canal da Companhia Bueiro Aberto com exibição do filme Oxente Bixiga, um mergulho na migração nordestina no bairro do Bixiga, São Paulo, e debate com os diretores Daniel Fagundes e Fernanda Vargas. Confira a edição aqui no blog e o debate no nosso canal: https://www.youtube.com/watch?v=q4uz79-Qytg

            E no domingo outro evento que marca essas ações que reúnem coletivos e ideias, o lançamento do streaming da Videoteca Popular, projeto do Caramuja, pesquisa e memória audiovisual, que reunirá filmes periféricos, cursos, debates, material para edição, exposições. A Videoteca é um projeto antigo, da época do CVP, e sempre foi um espaço importante para os coletivos. Breve também estaremos colando com nossos filmes.

            Mensagem do evento da Videoteca.

É com enorme alegria que anunciamos a festa online de lançamento da nossa histórica Videoteca Popular, que nesse ano completa 14 anos de dedicação a preservação da memória do cinema nacional e do audiovisual periférico.

Depois de tanto tempo entre DVDs, VHS e exibindo nas vielas, campos e escadões das quebradas de São Paulo, também no fomento ao canal do Youtube com preciosas lives com grandes expoentes do nosso cinema, chegamos enfim a concretização do nosso portal, que além de um streaming recheado de grandes filmes de diferentes épocas da produção audiovisual popular teremos a apresentação de todas as ferramentas da plataforma, que oferecerá além de um grande catálogo de filmes gratuitos e abertos, um serviço de suporte à coletivos e produtores autônomos, oferecendo banco de áudio, banco de imagens e artigos de referência. O site terá ainda uma galeria de artes periféricas e um nascedouro de filmes, onde qualquer pessoa de forma prática e rápida pode contribuir com a realização de novas obras dos coletivos e cineastas das quebradas.

Para celebrar tanta coisa bacana o cineclube da VP é especial, com duas sessões. Em uma delas celebramos as raízes da produção de vídeo popular com a exibição de um curta doc raro da ABVP "Quilombo da Memória" sobre a capoeira e a resistência negra nas bordas da sul com a Corrente Libertadora, filme dirigido pelo músico e historiador Salloma Salomão. Para prosear sobre contaremos com as presenças do próprio Salloma e do mestre de capoeira e cultura popular Eufra Modesto, um dos fundadores da Corrente Libertadora. Contaremos ainda com uma participação especial do cineasta Joelzito Araújo falando sobre a importância da ABVP na história do cinema brasileiro.

Em seguida exibiremos o longa doc "Dentro da minha pele", de Toni Venturi e Val Gomes onde nove pessoas comuns, com diferentes tons de pele negra, apresentam seu cotidiano na cidade de São Paulo e compartilham situações de racismo, dos velados aos mais explícitos. Em seguida uma prosa boa com os diretores.

Se eu fosse você não perdia, dia 27/06 as 17hs no youtube da Videoteca Popular.

Bora?

Relização: VP / Caramuja/ Fibra 10

Apoio: VAI TEC